Mendes critica Lula e diz que STF não precisa manter Battisti

Para Gilmar Mendes, o Executivo não poderia ter se negado a entregar o ex-integrante do grupo Proletários Armados pelo Comunismo (PAC) às autoridades .... Foto: Fellipe Sampaio/SCO/Divulgação
O ministro Gilmar Mendes, relator do caso Battisti no Supremo Tribunal Federal (STF), votou nesta quarta-feira pela anulação da decisão do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, tomada no último dia de mandato, que manteve o italiano no País. Em seu voto, ele criticou um suposto descumprimento, por parte de Lula, da decisão da Corte de extraditar Cesare Battisti, e defendeu que o ex-ativista fosse enviado imediatamente à Itália. Segundo Mendes, o Supremo não é obrigado a cumprir a decisão do então presidente Lula de não extraditar o italiano.
O voto de Mendes foi dado na análise da petição da defesa pela liberdade do ex-ativista. O plenário do STF já havia decidido mais cedo hoje, por seis votos a três, que o governo da Itália não tem legitimidade para contestar a decisão de Lula. Apesar da rejeitarem o direito de o país europeu recorrer, o presidente do STF, Cezar Peluso, determinou a continuidade do julgamento sobre a extradição e disse que o plenário ainda terá de analisar a validade da decisão de Lula de não enviar o italiano a seu país de origem, além de uma petição sobre a soltura imediata do ex-ativista.
Para Mendes, o chefe do Executivo não poderia ter se negado a entregar o ex-integrante do grupo Proletários Armados pelo Comunismo (PAC) às autoridades italianas, descumprindo o tratado de extradição entre Brasil e Itália, ainda que acreditasse em uma eventual perseguição ao ex-ativista na Europa. Para Gilmar Mendes, o não-cumprimento da extradição de Battisti autorizada pelo STF no final de 2009 retiraria parte dos poderes do STF e acabaria por transformá-lo em um "clube lítero-poético-recreativo".
"O Supremo passa a ser um objeto de brincadeira no plano institucional, de delírios dos mais diversos. A atuação do presidente da República é essencialmente vinculada aos parâmetros estabelecidos pelo STF, que autoriza a extradição. Não se conhece na história do País nenhum caso em que o presidente da República, nem no regime militar, deixou de cumprir a decisão do tribunal. A novidade, se é que existe novidade nesse caso, é é transformar isso em um ato de soberania", criticou ele.
"No Estado de Direito, nem o presidente da República é soberano. A inexistência de vinculação absoluta (da decisão do STF de extraditar Battisti) não implica dizer que é ilimitada a discricionariedade do presidente da República. Sem querer ser chato, gostemos ou não, estamos fazendo o exame de se o ato do presidente da República é condizente com essa decisão (do STF de extraditar Battisti). Não há espaço para cogitação de soberania aqui", defendeu Gilmar Mendes.
Caso Battisti
Ex-integrante da organização de extrema-esquerda Proletários Armados pelo Comunismo (PAC), Cesare Battisti foi condenado pela Justiça italiana à prisão perpétua por quatro assassinatos, ocorridos no final da década de 1970. O italiano nega as acusações. Depois de preso, Battisti, considerado um terrorista pelo governo da Itália, fugiu e se refugiou na América Latina e na França, onde viveu exilado por mais de 10 anos, sob proteção de uma decisão do governo de François Miterrand. Quando o benefício foi cassado pelo então presidente Jacques Chirac, que determinou a extradição de Battisti à Itália, o ex-ativista fugiu para o Brasil em 2004. Encontrado, ele está preso no País desde 2007.
O então ministro da Justiça, Tarso Genro, sob o argumento de "fundado temor de perseguição", garantiu ao italiano o status de refugiado político, o que em tese poderia barrar o processo de extradição que o governo da Itália havia encaminhado à Suprema Corte brasileira. Ainda assim, o caso foi a julgamento no Supremo Tribunal Federal (STF) no final de 2009, quando os magistrados decidiram que o italiano deveria ser enviado a seu país de origem, mas teria de cumprir pena máxima de 30 anos de reclusão, e não prisão perpétua como definido pelo governo da Itália. Na mesma decisão, no entanto, os ministros definiram que cabe ao presidente da República a decisão final de extraditar ou confirmar o refúgio a Battisti.
No dia 31 de dezembro de 2010, último dia de seu governo, o então presidente Luiz Inácio Lula da Silva decidiu não extraditar Battisti à Itália, com base em parecer da Advocacia-Geral da União (AGU) que levantava suspeitas de que a ida do ex-ativista a seu país de origem poderia colocar em risco a sua vida. Segundo o documento, a repercussão do caso e o clamor popular tornariam o futuro de Battisti "incerto e de muita dificuldade" na Itália.
Três dias depois da decisão de Lula, a defesa de Battisti entrou com um pedido de soltura no STF, mas o governo italiano pediu ao Supremo o indeferimento da petição, alegando "absoluta falta de apoio legal". Na ocasião, o presidente do STF, Cezar Peluso, negou a soltura imediata e determinou que os autos fossem encaminhados ao relator do caso, ministro Gilmar Mendes. No dia 3 de fevereiro, o governo italiano encaminhou STF um pedido de anulação da decisão de Lula, acusando-o de não cumprir os tratados bilaterais entre os dois países. O ex-ativista aguarda desde então uma nova manifestação da Suprema Corte brasileira.(Terra)

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