Divisão do Pará: solução ou novos problemas?
Com fulcro no § 3º, artigo 18, da
Carta Magna, o eleitorado paraense decidirá, através de plebiscito, os rumos
político-administrativos do estado. Caberá, a princípio, ao eleitor local
homologar ou não a criação dos estados do Tapajós e Carajás, resultantes da
divisão do estado do Pará.
Aprovado mediante decreto legislativo,
o plebiscito, segundo seus defensores, objetiva corrigir desigualdades, fruto
da inoperacional política de gestão do estado, que, devido a sua extensão,
inviabiliza políticas públicas individualizadas as regiões carentes de melhor
infra-estrutura.
Num primeiro momento, a subdivisão
traz aspectos interessantes, tal como a descentralização
político-administrativa da região, eis que uma vez fragmentado o território,
seria possível a adoção de mecanismos mais eficientes para equacionar
históricos desajustes regionais. Em outras linhas, o planejamento e,
conseqüente, execução de projetos restaria facilitado, face à redistribuição
populacional, que possibilitaria atendimento personalizado aos problemas de
cada região.
No entanto, numa análise confessamente
apriorística, se considerados os demais aspectos que orbitam o centro da
discussão, a criação destes novos estados pode resultar desafios deveras
complexos, quiçá maiores que os atuais, senão veja-se.
A proposta mostra-se controvertida ab
initio, haja vista a necessária disponibilização de verbas para atender o custo
da realização e preparo logístico do plebiscito. Ora, num país, que apesar dos
seguidos recordes de arrecadação tributária, a tônica é a escassez de recursos
orçamentários, afigura-se razoável despender o montante de cinco milhões de
Reais para tal finalidade?
É certo que a soma, de per si, não
seria suficiente para atender 1% dos problemas de qualquer estado brasileiro,
contudo, o emprego da verba pública encontraria melhor destino se investido na
modernização de equipamentos públicos (como exemplo, a aquisição de
instrumentos e materiais hospitalares), suavizando, ao menos, o problema de um
Município.
Ademais, uma vez homologada a proposta
legislativa, o objetivo de minimizar gastos e fortalecer finanças públicas da
região, provavelmente, cairá por terra nos primeiros dias de governo. Tal
constatação parece inequívoca, uma vez que, em atendimento aos preceitos
constitucionais, será necessária a criação de um novo Legislativo, Executivo e
Judiciário, com a conseqüente criação de novos cargos efetivos e em comissão,
representando expressivo incremento orçamentário às maquinas públicas
incipientes.
Forçoso reconhecer que os novos estados
não possuirão, de imediato, autonomia financeira suficiente para arcar com o
ônus administrativo que se impõe, exigindo da União aportes orçamentários para
suprir os gastos com folha de pagamento, aquisição de bens necessários ao
serviço público, dentre outras despesas.
Noutro vértice, surge o impacto na
arrecadação tributária do estado. Como é cediço, o Pará destaca-se por sua
invejável diversidade natural (comércio madeireiro), turismo, riquezas
minerais, pecuária, agricultura e potencial hidroelétrico (usina do Tucuruí,
uma das cinco maiores do planeta), fatores que impulsionam não apenas a
economia do estado, mas do Brasil de um modo geral.
Nos primeiros meses deste exercício
financeiro, o estado arrecadou mais de um bilhão em tributos, com destaque para
o ICMS, cujo crescimento superou a casa dos 23% em relação a 2010. [1] Tais
números comprovam a vocação econômica do estado como um todo, afastando, por
óbvio, quaisquer argumentos de natureza orçamentária no intuito de justificar
sua divisão
Neste sentido, a sugerida divisão
representará, também, o fracionamento econômico da região, enfraquecendo
substancialmente o orçamento dos estados envolvidos. Ainda que distribuídas,
tais riquezas e economias não parecem suficientes para atender a contento os desafios
das novas administrações, cuja manutenção anual girará em torno de R$ 2,9
bilhões (Carajás) e R$ 2,2 bilhões (Tapajós), segundo estudos do IPEA [2].
A nosso sentir, a solução para os
problemas do estado do Pará vai além da simplória divisão territorial. De fato
a dimensão geográfica do estado, aliada a má distribuição de renda, é
determinante para a situação de pobreza em que se encontram alguns Municípios,
contudo a pretensa subdivisão servirá apenas e tão somente como um paliativo.
Para encurtar distâncias, poderia a
Administração estadual, a titulo de exemplo, lançar mão de sub-administrações
regionais, a serem estabelecidas em locais de grande concentração, porém
afastados geograficamente da cúpula do governo. Tais órgãos funcionariam como
ouvidorias, estabelecendo verdadeiro elo entre as administrações regiões e
governo do estado. Não obstante, tal desconcentração propiciaria estudos e
planejamentos especializados para o desenvolvimento destas regiões, bem como
funcionaria como efetivo órgão fiscalizador dos recursos públicos repassados
aos respectivos Municípios.
No tocante a distribuição de recursos,
não é despiciendo consignar que este, lamentavelmente, não é um privilégio do
estado do Pará, mas um histórico problema brasileiro, cuja solução resta
condicionada à reforma tributária e, conseqüente, repartição de receitas.
Conforme descrito outrora, o estado destaca-se pela exportação de madeiras e
recursos minerais, porém, em nada se beneficia já que estas operações
configuram-se isentas consoante inteligência do artigo 3º, II, da Lei
Complementar nº 87/96. [3]
Considerando a vocação do estado para
comércio exterior, cabe a União modificar a legislação federal a fim de
prestigiar seu potencial econômico, incentivando a exportação, sem descurar o
relevante aspecto tributário destas operações para o desenvolvimento da região.
[4] Uma vez tributadas, tais operações abasteceriam os cofres paraenses,
permitindo maiores investimentos em regiões economicamente frágeis, cabendo,
ainda, ao estado promover emendas constitucionais voltadas a melhor
distribuição das receitas aos Municípios que o integram.
Desta feita, a subdivisão do Pará, com
a conseqüente criação dos estados do Tapajós e Carajás não parece ser a solução
mais adequada ao caso, assumindo viés paliativo no tocante aos problemas
estruturais que enfrenta. É preciso que o estado seja fortalecido por meio de
mecanismos administrativos e legislativos que permitam atendimento a todos os
municípios de forma isonômica, sem a necessidade de subdivisão territorial
administrativa.
Em verdade, a sugerida subdivisão do
Pará nos remete aos ideais propugnados por Lord Keynes, cuja teoria defendia a
contratação de uma pessoa para abrir e fechar buracos, sem aparente
necessidade, visando apenas à circulação da riqueza. Mutatis mutandis é o que
pretende a aludida proposta legislativa, promover a todo custo o giro de
capital, sem, no entanto, oferecer soluções concretas para a manutenção e
desenvolvimento econômico da região. (Richard Paes Lyra Junior)
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